No artigo abaixo pretende-se dar umas linhas gerais do que se tem de ter em consideração quando se decide o preço de um livro.
Um aviso à navegação: os valores que irão ser partilhados não são, nem pretendem ser, o padrão da indústria, ou uma verdade indiscutível. Cada caso é um caso e melhores ou piores condições podem ser negociadas, dependendo das especificidades do livro, editor, livraria ou distribuidor. O seguinte artigo corresponde à visão pessoal de Carlos Silva. Aceitam-se sugestões de correcção ou melhoria.
Primeiro de tudo, há três conceitos que irão ser usados neste artigo que é preciso definir:
- Custo – Quanto é que se tem de pagar para que o livro seja produzido.
- Preço (P.V.P.) – Preço de Venda ao Público. Quanto é que o leitor terá de pagar para comprar o livro.
- Valor – A importância (por vezes difícil de definir em euros) que o leitor atribui ao livro. Será também aqui utilizado como a importância que o leitor está disposto a gastar para comprar o livro.
Num mundo ideal, para o livro ser economicamente viável per se, o custo terá de ser menor que o preço, que por sua vez é menor, ou muito próximo do valor. Mas nem sempre um livro é viável economicamente por si só; por vezes está inserido num plano editorial a longo para para aquele autor ou coleção, onde a viabilidade se mede no total dos vários títulos vendidos.
Lei do Preço Fixo
Uma nota importante acerca do P.V.P. é que em Portugal o preço de um livro está sujeito à “lei do preço fixo”. Esta lei pretende proteger os pequenos livreiros da capacidade negocial das grandes livrarias de impor grandes descontos. Muito resumidamente, a Lei do Preço Fixo estipula que durante os primeiros 24 meses do livro no mercado este tem de ser vendido com o mesmo P.V.P. em todo o lado, só podendo ter um desconto até um máximo de 10%. Em ocasiões particulares (e.g. feiras do livro devidamente comunicadas) o desconto pode ir até 20%. Para conhecer mais a fundo esta lei, sugerimos a leitura do manual do IGAC.
Como é a anatomia do P.V.P. de um livro?
Vamos assumir um livro com um P.V.P. de 20€.
Os livros têm (actualmente) um IVA de 6%. Isto significa que dos 20€ que o leitor paga pelo livro, 1,2€ são entregues ao estado. Restam assim 18,8 €/livro.
Desses 18.8€, cerca de 40% a 60% (vamos assumir o extremo 60%) são destinados à livraria e ao distribuidor (numa distribuição 20/40, 30/30, 40/20, dependendo do acordo entre os dois). Quando um editor vende diretamente a partir do seu site ou numa feira do livro pode evitar ter de partilhar o valor do P.V.P. com o distribuidora e livreiros, mas aí entram custos de envio ou de participação nos eventos.
Grandes grupos editoriais têm as suas próprias distribuidoras (um negócio que só faz sentido quando se tem um grande catálogo para distribuir, beneficiando da economia de escala) o que lhes dá mais poder nesta “anatomia do P.V.P.”, incluindo uma maior capacidade negocial com as livrarias.
Um arranjo pouco comum em Portugal é certos livros serem exclusivos de uma livraria, ou de uma cidade. Isto seria interessante pois permitiria ao editor poupar do lado da distribuição, ao mesmo tempo que se aumentava a diferenciação da oferta das livrarias. Porém, isto seria feito a custo do alcance do livro, que num país de tão poucos potenciais leitores pode não ser viável.
Sobram então 40% do P.V.P. (fora IVA) para o editor, ou seja 7,52 €/livro. Deste valor, entre 5% a 15% (vamos assumir 10% – 1.8 €/livro) é normalmente destinado a royalties, ou seja, o valor de cada livro que é destinado ao autor. Maiores royalties são normalmente acordadas com autores best seller ou em segundas edições, altura pela qual normalmente os custos fixos já foram pagos.
Depois de pagas as royalties, restam 30% (5.64€/livro) para cobrir os custos de produção do livro, incluindo overheads (i.e. custos associados ao negócio em si como salários dos trabalhadores, fotocópias dos contratos, papel higiénico para o WC da sede da editora…) e a margem de lucro.
Para um livro feito em auto-edição é nestes 30% que tem de caber os custos de revisão, paginação, capa, impressão, marketing, entre outros.
Imprimir um livro
Por esta altura alguns estarão a perguntar: mas então quanto fica realmente imprimir um livro?
A título de exemplo, em impressão digital (parecido às impressoras que temos casa), uma tiragem de 200 exemplares de um livro em formato A5 com badanas, a preto e branco, com 350 páginas fica a cerca de 4 €/livro (Esta estimativa foi feita usando apenas um fornecedor-tipo. É recomendado pedir vários orçamentos para comparar preços, especialmente com a inflação que se tem sentido nestes últimos meses). Para grandes tiragens a impressão em offset (técnica de impressão usando rolos com tinta) consegue-se ainda custos por exemplar mais baixos.
Impressão Digital | Impressão Offset |
Apropriado para tiragens pequenas/médias. A partir de uma certa quantidade o preço/livro torna-se constante. | Apropriado para grandes tiragens. Demasiado caro para pequenas tiragens. |
Boa qualidade de impressão (dependendo do equipamento) | Óptima qualidade de impressão com cores consistentes entre o ficheiro digital e o livro final e entre cópias do mesmo livro. |
Rapidez de produção a pedido. | Necessita de uma preparação mais longa e as tintas levam tempo a secar. No entanto, em grandes tiragens permite fazer mais livros em menos tempo. |
Ou seja, este exemplo, os custos de impressão representariam cerca de 21% do P.VP. (excluindo o IVA).
É importante nesta fase deixar uma palavra de atenção acerca das gráficas. Ao longo destes anos tenho tomado conhecimento de exemplos de autores que decidiram enveredar pela auto-publicação que ao se dirigirem às gráficas foram apresentados com um conjunto de opções premium para os seus livros (e.g. gramagens maiores, capa dura, plastificações especiais, letras em relevo e metalizadas, lombadas cosidas, sprayed edges, etc…).
A tentação é grande, afinal não há dúvida nenhuma que alguns destes extras contribuem para um muito melhor aspeto do livro ou prolongamento da sua longevidade. Nesta fase é importante perceber se o aumento de custo irá ser acompanhado por um aumento de valor percepcionado pelo leitor. Um aumento do custo de impressão em 0,5 €/livro neste exemplo corresponde a um aumento de cerca de 2,5 €/livro no P.V.P. (excluindo o IVA).
Depósito legal
Todos os livros publicados em Portugal devem enviar uma cópia (ou 11, se a tiragem for superior a 100 exemplares, ou superior a 300 exemplares no caso das edições de luxo) à Biblioteca Nacional. O envio destes livros é da responsabilidade da gráfica, se esta for portuguesa, ou do editor, caso a impressão seja feita no estrangeiro. É usual o número de depósito legal constar da ficha técnica do livro, pelo que este deve ser requerido antes da impressão dos livros.
Mais informações poderão ser encontradas no site da Biblioteca Nacional.
ISBN – International Standard Book Number
Para ajudar à catalogação e especialmente caso o livro entre na distribuição geral é também útil requerer o ISBN (número de livro padrão internacional). Trata-se de um número com 13 dígitos único para cada livro e que identifica o país e editor. Em Portugal é a APEL quem emite e gere os ISBN cobrando entre 4,5 € a 15 € por ISBN (dependendo da quantidade de números comprados). Só é necessário um ISBN por título. Na maior parte dos casos, o código de barras de um livro corresponde ao seu ISBN.
Custos fixos
No fim, neste exemplo, sobram 9% do P.V.P. (excluindo o IVA) para todos os outros custos e margem de lucro do editor. Uma parte destes custos são custos fixos. Ou seja, custos que caso sejam impressos 2 livros ou 2 milhões não se alteram, como o custo de revisão, custo do ISBN, ou o custo da capa.
Para se fazer uma boa decisão comercial acerca do P.V.P. é necessário fazer uma estimativa de quantos livros se espera vender e por que canais (um livro vendido online do editor/autor para o leitor tem uma margem de lucro muitor maior do que um livro vendido através de uma livraria fornecida por um distribuidor).
Esta estimativa é também útil para perceber qual a tiragem a fazer. Assumindo que se espera vender 1000 exemplares poderá ser uma melhor opção a impressão offset do que impressão digital; mas caso a estimativa esteja errada, acaba-se por ficar com um valor total gasto em impressão maior sem hipótese de ser recuperado em vendas.
Como escolher o preço de um livro?
Estando todos os custos listados e as vendas estimadas, o preço mínimo por livro não será difícil de calcular. É depois do primeiro valor estimado que se verifica a necessidade de ajustar alguma das parcelas do P.V.P., seja reduzir os custos de impressão, seja investir numa campanha de marketing que irá aumentar o custo da tiragem, mas trazer mais vendas.
Por exemplo, uma capa apelativa pode ser mais cara, mas se trouxer mais leitores, é um custo fixo que pode acabar por se diluir no número de cópias vendidas.
Por fim, é necessário ter em atenção que o preço não é apenas um valor técnico, mas também uma ferramenta de marketing. Preços baixos poderão tornar o livro acessível a um número maior de leitores, ou apresentar um baixo risco para alguém experimentar um autor novo; por outro lado poderá também sinalizar ao leitor que o livro tem um baixo valor (mesmo sendo da mesma qualidade ou até melhor que outros livros com preços mais altos). É necessário perceber como é que o P.V.P. do livro em causa se posiciona em relação aos competidores e como se equipara em termos de valor.